quarta-feira, 11 de julho de 2012

Ateliê Memória e Narrativa de 11 de julho

                Vinte anos atrás chega a avó de Diane, Dona Adelina, no Romano. Vinda da quentura bahiana, ouvia falar que por essas bandas desvairadas não haviam crianças nas ruas, sorrisos desmedidos, tampouco a solidariedade nordestina, aqui, segundo diziam, era um perigo só. Saqueavam nas ruas, nas casas e na rodoviária. Mas como chegar nessa cidade sem passar por esses lugares? Teve que enfrentar. E enfrentou e desmentiu. Quer dizer, mais ou menos. É que o povo cresce as coisas né? Assim que a avó de Diane chegou, descobriu que o Seu Alemão era o responsável por organizar o bairro e não deixar que o tornassem favela. Barraco? Nem pensar. Mas não era só pela aparência que o alemão dizia isso, era porque as casas de taipa ou madeira não suportavam a imensidão do rio quando transborda. Mas Dona Adelaide só entendeu mesmo, depois que foi testemunha corpórea do que só, vez por outra, ouvia falar. A única coisa que fez Dona Adelina se espantar mesmo com essa São Paulo foi a quantidade de água que entrou dentro de sua casa na primeira grande chuva que passou, quinze dias depois de chegar no Jardim Romano. Era a primeira vez que via uma enchente. E essa palavra consegue conter o tamanho que essa coisa é? Luzia, comadre de Francisca, diz muito sobre a sensação que Dona Adelina teve ao ver pela primeira vez aquele mundaréu líquido, ou seria pastoso? Pensei que o fim do mundo fosse de fogo, mas é de água. Dona Adelina lutou pela permanência no bairro, ainda que a chuva parecesse querer dizer que aquele não era o seu lugar e a prefeitura tentasse convencer Dona Adelina a vender a sua casa por R$2.000,00, com esse dinheiro a senhora compra uma nova casa, não é mesmo? Pense direito, é um bom negócio. Ah, mas Dona Adelina sabe o que é enfrentar. Posso não ser letrada, mas entendo das coisas.                 
               Quero voltar lá, preciso ouvir mais daquela senhora que de sorriso largo, café pronto e sotaque que me é comum, nos recebeu em sua cozinha para papearmos sobre ela e aquele bairro, do qual só sai pra colher seus legumes e pescar alguns peixes no sítio próximo de uma comadre.



Por Ana Carolina Marinho.






Ateliê Memória e Narrativa - de volta para a sede depois de uma manhã
de conversas com os moradores, inclusive com Dona Adelina, vó de Diane. 

Nenhum comentário:

Postar um comentário