Daqui a pouco o peixe pula




        Daqui a Pouco o Peixe Pula...

           O Jardim Romano é um bairro do extremo leste da cidade de São Paulo que durante dez anos sofreu com grandes enchentes. A última delas ocorrida entre dez/2009 e fev/2010 assolou a vida de milhares de moradores. Em meio a este cenário a vida foi devastada. A convivência entre o público e privado é unificada pela água transbordada. Transbordaram histórias, eclodiram memórias e peixes-narrativas saltam da boca dos moradores.          O Jardim Romano é um bairro constituído em sua maioria por migrantes nordestinos que foram se apossando das terras de um terreno pantanoso. A cidade cresceu engolindo a experiência natural. O crescimento desastroso gerou conflitos sociais fortíssimos no seio da Paulicéia desvairada pelo capital, criando distâncias assombrosas entre os seus moradores. O presente projeto propõe a continuidade de uma pesquisa de um ano e meio no Jardim Romano que parte das memórias subterrâneas dos moradores de um dos bairros mais pobres e esquecidos da cidade para a ocupação das ruas deste lugar através de ações culturais de criação como metodologia para a construção de uma dramaturgia pautada na história oral através desses depoimentos.         Na primeira etapa do projeto depoimentos em vídeo foram recolhidos através de entrevistas que partiram para algumas frentes que estão sendo realizadas no ano de 2012 através do fomento gerado pelo Programa VAI da Secretaria Municipal de Cultura de São Paulo; e pelos Proac´s de Artes Visuais e Primeiras Obras em Artes Cênicas da Secretaria Estadual de Cultura de São Paulo. No trabalho com as artes visuais estes depoimentos estão sendo transcritos nas paredes do bairro e ilustrados pelo grafite de Ignoto, morador do Romano. O artista do grafite foi o primeiro a espelhar esta memória através da poesia visual dos grafites, tatuando nas paredes a inquietação latente dos soldados romanos. A perspectiva de trabalho nesse projeto se dá em duas etapas: o trabalho de site specific de exploração das ruas e paredes do bairro através dos grafites e narrativas. As paredes do bairro estão virando uma galeria a céu aberto, na qual um livro ilustrado se configura a cada muro-página ilustrado por Ignoto. Partindo do conceito de arte pública como interferências na fisionomia urbana, recuperação de espaços degradados e promoção através das artes visuais do debate cívico em um movimento de se voltar para o espaço público, o projeto está construindo narrativas visuais através do grafite pelas ruas do Romano dialogando com as narrativas de vida dos moradores que viveram a enchente durante três meses de 2010. As paredes do bairro tornam-se tatuagens vivas e, assim, um exercício poético com a memória revela nas narrativas os traços de um artista morador do bairro. As ruas do bairro estão virando as páginas de um livro, nas quais narrativas escritas e ilustrações traçam um percurso na memória. O registro desse processo de criação, bem como o recolhimento de outras materialidades visuais fornecidas pelos moradores (fotografias, sucatas, móveis, etc...), formarão uma instalação que irá ocupar uma galeria da cidade no segundo semestre de 2012.         O projeto com as artes cênicas é desenvolvido pelos moradores numa busca pela construção de um experimento de cena pautado na ideia de intervenção urbana, a partir de oficinas de criação de dramaturgia. Inicia-se, pois, um exercício autopoético visto que grande parte do material transposto nas paredes e utilizado na pesquisa são memórias destes atores sociais, no sentido mais radical dessa expressão, já que eles são detentores dessas matrizes através de suas histórias de vida. A pesquisa com os moradores resultará num primeiro experimento em frente aos grafites e migrando para frente da casa dos outros moradores nos quais seus relatos inspiram a construção de cenas. Na terceira frente do projeto realizada através do Programa VAI um espaço foi alugado para que ateliês de criação pudessem trazer mais moradores para perto do processo criativo dos outros projetos. Nesse sentido, os seguintes ateliês de criação compõem essa jornada: Ateliê Memória e Narrativa, construindo narrativas sonoro-literárias; Ateliê Caminhando nas Águas, perna de pau e o Ateliê As Paredes Tatuadas, grafite. 

          Ensaio nas ruas do  Jardim Romano - Soldados Romanos (abertura)